terça-feira, 12 de maio de 2009

Ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais

Por Mônica Salmazo

Gisele sempre foi uma garota reservada para os desconhecidos e bem popular entre os amigos. Seu jeitinho de boneca encanta a todos, é o lado positivo de qualquer pessoa. Sua inteligência e instinto de maternidade com todos sempre foram notáveis, é a pessoa certa para se divertir ou chorar junto. Um leve dom para moda e uma incrível paixão pelo jornalismo, estilo e educação refinados, de dar inveja à muita gente por aí. Cabelos claros, curtos, talvez seja inspirado em uma de suas heroínas: Coco Chanel. Pele clara, cheiro doce e andar únicos, bem diferente e ao mesmo tempo parecida com sua amiga Samanta.
Samanta era radical, adorava festas, e era melhor ainda se as festas fossem de segunda a domingo, uma bebida nunca poderia ser dispensada ou desperdiçada, mas é uma garota carinhosa, atenciosa e única. Já passou por muita coisa em sua vida mas continua sempre de bom humor e com a cabeça erguida. Não tem hora para a diversão, mas sempre tem em mente a responsabilidade. Famosa pelo cheiro dos seus cabelos, negros como um céu sem lua mas cheio de estrelas, e pelo tamanho de seu bumbum (atrativo para muitos homens). Um exemplo para aqueles que são apaixonados pela vida. Louca e apaixonada pelo jornalismo também, foi por isso que conheceu Gisele e Monalisa.
Essa última sempre foi aberta a aventuras, apesar de manter os pés no chão. Não é louca pelo jornalismo como as amigas, mas diz ter uma vocação para ser escritora. No amor nunca teve muita sorte, mas já se entregou inteiramente à ele, sem medo do que poderia vir depois, sem medo das consequências, como sempre, aventureira. Se sofreu? Muito. Mas diria que valeu a pena, cada tombo foi um aprendizado. Apesar das quedas não desiste de procurar pelo amor, ela acredita nele. Sedenta por conhecimento. O termo "loira burra" com certeza não se encaixara a ela.
Seus cabelos longos balançam quando ela caminha, e irradiam uma graça e luz tão grandes que conquista o recinto por onde passa. Os olhos são profundos e abertos, o caminho de sua alma.  Se encarados de verdade, é possível saber quem ela é. Doce e meiga por um lado, dura e sincera quando precisa. A "do meio", mais velha que Gisele e mais nova que Samanta. Formavam um trio insdiscutivelmente... indiscutível!
Em uma tarde de sábado resolveram viajar, ir descansar com a turma no rancho do Márcio, paquera da Samanta. Vivia jogando charme e criava coragem de chegar perto dele quando bebia nas festas, mas nunca havia acontecido nada entre eles.
A tarde foi gostosa, enquanto os homens faziam o almoço as mulheres ficaram bebendo e jogando cartas na varanda. Eram no total de oito pessoas, Samanta, Gisele, Monalisa, Beatriz, Mariana, Márcio, Leonardo, Tiago e Felipe, uma galerinha bem animada, resultado das festas de faculdade.
Não estavam preocupados com horários, responsabilidades, pais ou qualquer outra coisa que não fosse se divertir, aproveitar o final de semana e voltar relaxado para encarar o stress da cidade. Samanta já estava guardando a segunda caixa de cerveja quando deixou cair a garrafa e a cerveja se espalhou pelo chão. Sua expressão foi de total perda, com a boca aberta Monalisa foi abraçar a amiga que estava chocada.
Depois de alguns minutos levantou e disse que teria que compensar o erro e voltou para a mesa e continuou bebendo com a turma. Leonardo se levantou e resolveu "desbravar" o rancho e convidou a galera toda. Munidos de todo o material necessário foram para o meio do mato que era iluminado pela lua cheia.
A trilha seguia inclinada para baixo, um após o outro, em fila indiana, descendo a ladeira. Alguns tombos pelo caminho, ou pelo grau alcoólico, dificultavam e atrasavam o restante da trupe. Um sapo surgiu e pulou no caminho, foi o suficiente para Gisele entrar em desespero junto com Mariana, as duas irmãs se abraçaram e praticamente fizeram em 30 minutos o trajeto que levara 2 horas para se fazer até ali. De volta à casa o pessoal começou a cair, um de cada vez, e as três sobraram.
Nessa hora Monalisa se levantou e sugeriu um passeio até o laguinho a alguns metros de distância da casa, as amigas toparam na hora. O barquinho foi munido de tudo o que era necessário para continuar mais uma longa noite, e lá estavam as três locas. Remaram lago adentro e pararam. Ficaram lá curtindo e cantando.
Faltavam apenas alguns minutos para o céu começar a clarear quando os meninos escutaram as loucas no meio do lago cantando:
"Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos... ainda somos os mesmos... e vivemos... ainda somos os mesmos... e vivemos... como os nossos pais...", de um salto o remo caiu no lago e a cantoria parou.
Tudo ficou em silêncio, o pessoal da borda olhavam para elas e elas para eles. Após alguns minutos o pessoal da borda começou a soltar: "Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não... você diz que depois deles não apareceu mais ninguém... você pode até dizer que eu tô por fora ou então que eu tô inventando...", e naquele ritmo a manhã foi surgindo. Raios de sol vermelhos como fogo envolvidos em uma corrente amarela ouro, a brisa do vento só foi aumentando, levando a voz deles ao longe, até onde Elis Regina estaria, mesmo não estando aqui.
Naquela hora eles perceberam que não há nada melhor do que a juventude, fazemos burradas, decepcionamos os amigos, assustamos os pais e tropeçamos a maior parte do tempo. A amizade é algo que deve ser cuidado com muito carinho, cultivado a cada passo. A frase "os amores vem e vão, mas as amizades são eternas" é totalmente discutível, afinal, o que é a amizade a não ser uma forma de amor?
E foi na manhã de verão que elas perceberam que apesar de todos virem e irem embora elas sempre tinham umas as outras. De que as amizades vão embora às vezes por necessidade e que isso é inevitável. Mas que elas, ah elas, elas sempre seriam elas, sempre seriam as três loucas cantando que sempre foram as mesmas e sempre viveriam como seus pais, sempre serão três e sempre serão indiscutíveis.

"Não quero lhe falar,
Meu grande amor,
De coisas que aprendi
Nos discos...

Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
Eu sei que o amor
É uma coisa boa
Mas também sei
Que qualquer canto
É menor do que a vida
De qualquer pessoa...

Por isso cuidado meu bem
Há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal
Está fechado prá nós
Que somos jovens...

Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço,
O seu lábio e a sua voz...

Você me pergunta
Pela minha paixão
Digo que estou encantada
Como uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade
Não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento
Cheiro de nova estação
Eu sinto tudo na ferida viva
Do meu coração...

Já faz tempo
Eu vi você na rua
Cabelo ao vento
Gente jovem reunida
Na parede da memória
Essa lembrança
É o quadro que dói mais...

Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Como os nossos pais...

Nossos ídolos
Ainda são os mesmos
E as aparências
Não enganam não
Você diz que depois deles
Não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer
Que eu tô por fora
Ou então
Que eu tô inventando...

Mas é você
Que ama o passado
E que não vê
É você
Que ama o passado
E que não vê
Que o novo sempre vem...

Hoje eu sei
Que quem me deu a idéia
De uma nova consciência
E juventude
Tá em casa
Guardado por Deus
Contando vil metal...

Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo, tudo, tudo
Tudo o que fizemos
Nós ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Como os nossos pais..."