quarta-feira, 15 de julho de 2009

Lábios vermelhos

http://www.culturalivre.net/wp-content/uploads/2009/01/boca-vermelha.jpgPor Mônica Salmazo

Com grandes olhos negros e um cabelo cor-de-fogo ela seguia em direção ao horizonte. Em sua cabeça os fatos ficavam se repetindo sem parar, sem lhe dar ao menos alguns minutos para descansar sua mente e seu coração ferido.
Não entendia como tudo aquilo acontecera, não era possível que algo assim pudesse existir, mas finalmente decidiu ir embora.

Era fim de outono e o vento frio passeava pelas ruas, prestes a colorir tudo de branco com a chegada do inverno, o único som que se ouvia era o sapato marrom velho que apertava os pés de Juliana.
Entregar jornais nunca fora o sonho dela, mas sabia que para chegar onde queria era necessário algum sacrifício, se calava e continuava seus afazeres. Ela escutou um latido e correu para a rua, assustada, ela não havia visto que a casa abandonada tinha novos moradores. Um cheio estranho invadiu seus pulmões e uma boca desconhecida estava lhe beijando os lábios, a sensação era de que tudo estava tudo fora do normal e que o mundo havia enlouquecido, ou ela tinha enlouquecido.
Ao abrir os olhos viu um belo par de olhos verdes água e um cabelo preto, liso, comprido que ajudavam a contornar o rosto delicado do garoto que estava a sua frente. Seus lábios eram grossos e vermelhos e quentes, muito quentes.
Ele pegou em sua mão e levou-a até a casa e a fez sentar nas escadas de entrada, era estranho como nenhuma palavra havia sido dita ainda. Ela tentou falar algo, mas imediatamente os dedos do garoto calou-a, pedindo simbólicamente silêncio.
Após alguns minutos ele se levantou e entrou em casa, ela foi embora sem saber o que fazer ou pensar.
Durante 5 meses ela passava todos os dias na porta da casa pontualmente às 10 horas da manhã e todos os dias o garoto saía da casa e lhe dava um beijo, sentavam-se durante alguns minutos na escada sem dizer nada e ela ia embora.
A paixão aumentava e ela não sabia quem ele era, mas estava perdida de amor.
Mudara tudo, seu jeito de andar, de vestir, de pensar, de agir, havia mudado até mesmo o seu jeito de falar pensando no dia em que conversaria com ele.
O verão havia chegado e as noites se tornaram insuportavelmente quentes, e ela sonhou. Sonhou que estava tudo escuro e apenas uma luz no centro, o garoto aparecia, seus lábios estavam tão vermelhos que pareciam arder, ela tentava o alcançar mas não conseguia, tentava falar, gritar, berrar para que ele a escutasse. Acordou toda suada às 11 horas. Levantou desesperada e saiu correndo para a casa dele. Bateu três vezes na porta mas ninguém atendia.
Tentou dar a volta e entrar mas não adiantou, tudo estava bloqueado. Voltou para casa e esperou até o outro dia. Nada no dia seguinte, e também no outro, e no outro, e no outro e foi assim durante a semana inteira. Ela esperou o outono, o inverno, a primavera e quando o verão voltou novamente ela já não falava, não comia direito e não levantava mais da cama.
Recebeu uma foto estranha, com uma boca vermelha e um dedo na frente, fazendo um sinal de silêncio. Seu coração acelerou e ela imediatamente procurou saber se era ele, foi correndo até a casa mas não havia nada, procurou por todos os lados informações de onde viera a foto. Passou um mês procurando e finalmente descobrira que a foto vinha da França.
Arrumou suas coisas e jurou ir embora, em busca de seu amor, e não iria olhar para trás, não importasse o que acontecesse. Sofrera demais e estava na hora de correr em busca de seus sonhos ao invés de ficar entregando jornais para o resto da vida.

Ela saiu de casa e começou a andar em direção ao horizonte. Só precisava dizer à ele: Eu te amo!