quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Banho

Por Maria Gabriela Brito

Trabalhou o dia inteiro capinando jardins de casas chiques, não cobrava caro e fazia o serviço com amor e muito cuidado. Talvez tenha limpado uns 10 quintais naquele dia, e ganhado alguns bons 60 reais que pagariam a conta de luz do mês passado, a deste mês e talvez ainda desse para comprar comida.
Estava sujo e cansado quando terminou a última casa. Subiu em sua bicicleta e pedalou por longos e intermináveis sete quilômetros, distância equivalente entre os bairros nobres da cidade e a semifavela onde morava. Sua vida era medíocre, mas ele nunca reclamou, era muito simples pra isso.
Suas costas doíam, mas a vida o calejou o suficiente para não dar atenção a qualquer tipo de dor. As mãos pareciam estar mais grossas, típicas de um homem que trabalhou desde menino. Tudo para sustentar sua esposa e os quatro filhos pequenos.
Finalmente estava perto de casa, a barriga roncava de fome. Pensou se a mulher havia feito aquela sopa de jiló e moranga com muita água para ter o suficiente para a família de seis pessoas. Pensar no cardápio da janta deu água na boca.
Chegou suado na porta, já estava anoitecendo. Imaginou aquele banho relaxante que ia tomar. Banho relaxante que nada, pobre não tem banho relaxante, era só pra limpar mesmo. Tinha que racionar, o bairro andava sem água nos últimos dias.
Abriu a porta e viu a mulher na cozinha. A barriga doeu de fome, mas queria mesmo era aquele banho gelado, com os poucos fios de água desordenados que caiam do chuveiro. Foi direto para o banheiro, parou já sem roupa, ansioso, em frente à torneira. Rodou até as últimas e nem uma gota de água caiu.
Ficou chateado por um momento, mas foi dormir conformado e sujo mesmo, sem comer sopa. No outro dia acordou do jeito que foi dormir, sujo. Seu café da manhã foi a sopa aguada e fria da janta. Montou em sua bicicleta e foi dar continuidade à sua subvida, torcendo apenas para que quando voltasse naquela noite, tivesse água para tomar banho.