sexta-feira, 30 de abril de 2010

A vendedora

Por Maria Gabriela Brito


Todos os dias daquela última semana quando passava por aquela rua a caminho do trabalho ela o via. Ele ficava ali, estático esperando por ela à porta daquela boutiquezinha barata. O local era apenas uma entradinha feia e sem graça, perdida no meio daquela rua comercial movimentada de lojas e vitrines atraentes.

Por várias vezes ela desejou parar, mas seu horário apertado não permitiu. Como era doído vê-lo tão lindo ali dando sopa para qualquer outra que poderia aparecer casualmente e arrastá-lo boutiquezinha afora. Naquela manhã antes de sair de casa, ela não suportou e prometeu parar e levá-lo embora com ela.

Ele tinha que ser seu! O percurso foi demorado. Ela estava tão ansiosa com a idéia de tê-lo só para ela que a barriga remexia insistentemente de uma maneira tão desagradável que a deixava enjoada. Passou esperançosa pela loja, mas ele não estava lá. Alguma vadia com certeza tinha visto nele a beleza exótica que ela avistou de primeira no começo daquela semana.

Foi embora derrotada e sem ânimo. Dali para frente suas manhãs seriam muito vazias e sem graça. No outro dia, triste como estava quase desistiu de passar por aquela rua que traziam tantas lembranças, mas pensou que seria inútil e uma hora teria que superar. Quando estava praticamente em frente à lojinha decidiu parar e perguntar. Às vezes alguém ali poderia ter notícias dele. Estacionou o carro e desceu.

Atravessou a rua cheia de pensamentos positivos. Ela havia lido em um livro que o universo conspira a nosso favor quando pensamos positivos, talvez com ela funcionasse também. Entrou na loja e atrás do balcão estava uma mulher de uns 40 anos. Cabelos loiros bagunçados em um rabo de cavalo mal feito.

Ela usava um batom rosa escuro cintilante que com certeza não havia sido moda nem na década de 80. O rosto era redondo e muito branco. Vestia uma camiseta amarela regata apertada demais para seu corpo rechonchudo, e uma bermuda jeans azul clara de lycra que não lhe caia nada bem.

Ela perguntou por ele, e a vendedora respondeu com uma voz chata e aguda, que seria impossível de ouvir por mais de trinta segundos.

-Há querida, eu me lembro dele sim, acho até que ele está por aqui, espera um minuto que vou procurá-lo para você. – Grunhiu a mulher.

Ela ficou extasiada com a idéia de poder vê-lo novamente. Sentiu de novo aquele embrulho no estômago.

A vendedora desapareceu atrás de uma parede e retornou após alguns infinitos segundos. Lá estava, ainda mais bonito do que ela se lembrava. Tinha que ser dela.

-Quanto é?

-R$139,90, mas posso dar um descontinho à vista.

-Oi?

Tudo bem, o vestido era lindo, mas não valia mais do que uns quarenta reais, ainda mais naquela lojinha feia e com a pintura descascando. O vestido era curto, de um tecido vagabundo, mas com uma bela estampa de oncinha. O corte e o caimento eram legais, mas com certeza não valia aquilo tudo.

Percebendo a indiginação da moça, a vendedora pegou a calculadora e fez algumas contas que só ela mesma entenderia, e disse que faria o vestido por noventa reais.

-Leva querida, vai ficar lindo em você. – Que lábia!

-Eu to achando um pouco caro, esse tecido não é de boa qualidade.

-Querida, você não está entendendo, esse vestido é MGucci.

-Oi?!?

A mulher disse aquilo como se ser “MGucci” fosse o que todo vestido quisesse ser. E o que era MGucci afinal de contas?

A peça não valia o preço, e ainda era de uma marca totalmente desconhecida que agia como se fosse o auge do momento, mas ela não agüentava mais ouvir aquela voz irritante e preferiu não discutir moda com uma maluca que usava batom verão mil novecentos e nunca.

Comprou o vestido e foi embora aliviada. Não por finalmente ter a peça, mas por ter se livrado da visão daquela breguice ambulante e de sua voz insuportável.

Chegando em casa foi que ela se deu conta. Realmente havia comprado o vestido. Desembrulhou o pacote e olhou a peça. Um pouco revoltada, um pouco feliz e muito suspresa com a astúcia da mulher, pensou:

- Vendedora esperta do c******!

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Blog da Quinzena

Fluidez: A palavra que define o blog desta quinzena. O Misquilinas de Bruno Reis mereceu este posto. O blogueiro usa o espaço como coluna, diário, jornal! Ele é um dos que realmente sabe aproveitar o blog. Fala de música, de cinema, de coisa importante ou de futilidades, seja para criticar ou elogiar.
Seu texto flui tão naturalmente que é impossível não ficar envolvido com a opinião dele.
É com muita satisfação que indicamos o Misquilinas para o leitor do Delírios!

Acessem que vocês vão gostar!