quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Falar até ouvir

Por Mônica Salmazo

Aprender a ouvir.

Ela deveria ter aprendido a ouvir desde cedo mas não, falar era sua especialidade. Agora estava cabisbaixa, abismada pelo incontável número de burradas que havia feito na vida apenas por falar demais, e não saber ouvir.

Escutar todo mundo escuta, pensava ela. Somente agora, anos e anos de erros é que ela foi entender a diferença entre escutar e ouvir.

Escutar é escutar, nada demais, a gente escuta os sons e diálogos, mas ouvir, nãooo, ouvir é diferente, é processar a informação, é raciocinar sobre o assunto, é pensar antes de agir, ouvir antes de falar.

Rubem Alves já dizia que "nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade", agora ele tinha razão.

Glória levantou a cabeça, pesada após horas de culpa e vergonha que a obrigara a abrigar seu rosto em suas mãos, talvez como uma escapatória, uma camuflagem para a vergonha que sentia.
Ela avistou a razão de sua dor: ele ainda a fitava com os olhos cheios de ódio.
Não adiantava pedir para voltar, não adiantava querer cair nos braços dele, não adiantava tentar, e pela primeira vez na vida ela não sabia o que falar.

Lembrou da avó que lhe dizia que sábios são os que sabem ouvir e medir suas ações, esperto é aquele que ouve mais do que fala, mas para quê??, para que é que tinham que citar frases ao invés de explicá-las?, tornou-se uma forma mais conveniente para as pessoas sair recitando frases filosóficas ou poéticas e esperar que um dia, talvez, a pessoa aprenda na prática?, por que não a fizeram entender isso antes?, quantas e quantas palavras ela poderia ter economizado, quantas lágrimas, quantos arrependimentos, ai meu Deus, agora não adiantava mais.
O silêncio dominou o quarto, apesar dos raios invadirem as janelas, a escuridão dominava os pensamentos.

Ela sempre fora fiel, sempre amou de verdade, sempre deu o melhor de si, mas também poderia ter aprendido a ouvir, falava coisas que machucavam, falava desnecessariamente, mas acima de tudo ela achava que estava certa, que ele não precisava dizer o que havia de errado, sua consciência se encarregaria de filtrar as informações.

Como estava errada, Glória estava errada, até mesmo em seu nome de batismo. "Glória, glória, ha, fracasso seria mais adequado", pensava ela.

E isolada em seu próprio fracasso e mergulhada em sua própria vergonha, ele a deixou sentada ali, sozinha, sendo devorada pelo negro véu que a Lua trazia.

A última gota de lágrima caiu no travesseiro quando ela adormeceu.

Quando acordou ela não sabia mais falar, Glória aprendera, finalmente, a ouvir.

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